Crianças, jovens, adolescentes e idosos juntos semeando e colhendo frutas, legumes e hortaliças, mas não só isso: o Projeto Semear e Colher plantou e colheu transformação social.
Foi assim que em dois estados do nordeste brasileiro, sete organizações se uniram e juntas executaram a primeira ação da rede de parceiros Solivida voltada para o incentivo de agricultura urbana e periurbana.
O projeto foi realizado durante dois anos, onde as organizações, cada qual com sua expertise e metodologias, desenvolveu ações em suas respectivas cidades, tanto em Pernambuco quanto no Ceará, com todos os esforços orientados para a transformação de vidas através do incentivo à um estreitamento da relação entre pessoas e meio ambiente,
Tal trabalho não poderia deixar de resultar em mudanças de hábitos alimentares.
Muitos que participaram do projeto foram beneficiados tanto em termos de melhoria do espaço em que viviam como financeiramente. A disposição das famílias participantes do projeto nos dois estados para cooperarem entre si foi um elemento essencial para obtenção de resultados que superaram as espectativas das organizações que executaram o Projeto Semear e Colher.
Superação de depressão, síndromes e doenças resultantes de má alimentação, como o colesterol alto e obesidade em crianças, foram alguns dos benefícios diretos obtidos através do trabalho com as hortas comunitárias.
“Minha filha mais velha sofreu uma grave queimadura e para sua recuperação, fui orientada pelos médicos, alimentar ela de folhagem verde e frutas, como não tinha condições de comprar, a horta do flau me ajudou bastante, posso dizer que chegou na hora certa, no momento em que eu precisava e que minha família precisou”, disse entusiasmada com o projeto Carolina Patrícia dos Santos, beneficiária da Turminha do Flau.
Além de auxiliar na recuperação da filha da Carolina,o Semear e Colher fez também com que outras mães e moradores da comunidade de Brasília Teimosa no Recife, refletissem e se juntassem ao projeto, vendo a atividade como uma ponte na mudança de vidas, aumentando a interação entre indivíduos que antes tinham pouca convivência social e padeciam de problemas de saúde que aos poucos vêem sendo superados a partir da rede de apoio e confiança criada ao longo do processo:
“Tinha muitas crises de labirintite, dores de cabeça e inicio de depressão, um dia que passo na horta vale como uma semana de terapia, aprendemos com o trabalho e assim trabalhamos os nossos estresses do dia a dia”, disse sorrindo e muito empolgada, Sara Araújo Barros, Beneficiária da Turminha do Flau.
A Comunidade dos Pequenos Profetas (CPP) do Recife desenvolveu uma ação que foi importante para muitas famílias, fazendo com que elas saíssem da sua zona de conforto e iniciasse uma nova fase, através da gastronomia social que, segundo a direção da entidade, teve como foco principal unir as famílias de origem das crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, tendo como ponto de partida a prática do cultivo de hortaliças em garrafas pet e da alimentação saudável que resgata a autoestima e noções de autocuidado, o que aponto para o potencial da gastronomia como uma ferramenta de transformação social e ambiental.
Muitas famílias que participaram do projeto deram um novo sentido à vida, pois através do Semear e Colher viram uma nova oportunidade de, além de uma obterem educação alimentar, puderam perceber como pequenos gestos gerados coletivamente podem alterar significativamente uma paisagem concreta e também subjetiva: “Antes de conhecer a CPP e a ação Semear e Colher vivia no ambiente onde permeava lixo, drogas, entre outros problemas, e depois do projeto pude ver que existe outro horizonte, uma janela se abriu para mim”, afirmou a Beneficiária do projeto CPP, Paula Ferreira da Costa.
Além de mudar a rotina alimentar dos seus atendidos a CPP mudou a vista aérea da cidade do Recife, fazendo uma mudança radical e impactante no telhado de sua sede. Segundo a direção, o projeto une conceito de sustentabilidade, responsabilidade socioambiental e democratização do acesso a produção orgânica e a gastronomia saudável em localidades com baixo IDH do Recife. Contando com 363,66 metros quadrados de hortas orgânicas,o Telhado Verde é uma estrutura ecológica de madeira, intercalada com painéis de energia solar, tudo isso em cima do casarão antigo, no coração do Recife, onde hoje funciona a sede da organização.
Segundo Demetrius Demetrio, Presidente da Comunidade dos Pequenos Profetas, o telhado é onde “produzimos produtos para o pessoal que está em uma situação de empobrecimento social, pessoal que não tem o poder de compra, e aqui eles podem plantar, colher e consumir, dando uma acessibilidade a uma boa alimentação”.
Para os beneficiários o Telhado foi um elemento chave na mudança de hábitos, como falou a Paula Ferreira da Costa sobre a reeducação alimentar que ela teve, “para mim o cultivo da horta é essencial, pois através disso temos uma reeducação alimentar, como eu que inseri mais salada na alimentação e produtos saudáveis, deixei de comer coxinha, hambúrguer, o lanche servido em minha casa agora é salada de fruta, sem o açúcar e sem o leite condensado. Até as cascas dos alimentos são aproveitados na minha casa”.
Mulheres tiveram melhoras significativa em seus quadros de saúde. Aquelas à quem culturamente tem-se atribuído a responsabilidade pelo cuidado com os demais membros da família, puderam ter mais atenção a sua própria saúde.
“Antes eu não me preocupava muito com alimentação saudável mesmo sendo diabética e com o projeto tive conhecimentos de frutas, despertei para uma vida saudável, mudei minha rotina de hábitos não corretos para hábitos melhores e assim comecei a passar o conhecimento que adquirir para outras pessoas”, disse entusiasmada, Tereza Cristina do Nascimento, beneficiária da Casa Menina Mulher.
A Casa Menina Mulher (CMM) foi umas das organizações do Recife que executou o projeto Semear e Colher em três módulos, fazendo com que diversas atendidas pela casa olhassem para o meio ambiente com um novo olhar e promovendo uma convivência familiar potencialmente transformadora muitos dos participantes: “uma das mudanças que tive com o semear e colher foi aprender a lidar com o filho de outra participante do projeto CMM. Pois o garoto era deficiente mental e em muitos momentos eu enjeitava, eu tive que buscar um suporte para aprender a lidar melhor com a situação, eu tinha agonia com a sua presença e após o projeto aprendi que é importante aprender a lidar com os limites”. Disse Jadriane Maria Pires, beneficiada pela Casa Menina Mulher.
As mudanças de hábitos comportamentais são vistas no olhar, no falar e no fazer dos beneficiários, como os jovens da Ilha de Deus do Recife, que junto à comunidade mudou a imagem da Ilha, realizando o reflorestamento e a limpeza do mangue. O centro Educacional Saber Viver plantou 20.000 mil mudas ao entorno da Ilha num projeto envolveu de crianças à idosos ao longo dos dois anos do projeto Semear e Colher.
“ Com o Semear e Colher a gente teve mais vontade fazer a coisa, podendo ir pegar lá no rio e no mangue, pegando o alimento e preparando para o povo, com isso preparamos diversos pratos com vários tipos, como sururu, mariscada entre outros, valorizando o prato típico da nossa comunidade, podendo assim escolher o que comer”, disse bastante determinada e entusiasmada, Geisiane de Ataíde, voluntária do Saber Viver.
A ação a Ilha vem fazendo com que o verde sumido, voltasse com um novo encanto e assim o manguezal voltou a embelezar a comunidade.
A comunidade abraçou a causa, e os pescadores e seus familiares realizaram um grande mutirão de limpeza dos rios e de plantação, tudo com o apoio de diversos voluntários. Durante toda a execução do projeto Semear e Colher, o projeto Saber viver junto com os moradores da Ilha, produziu diversas hortas verticais e realizou diversas doações para as famílias da comunidade e das outras comunidades ao entorno da ilha.
“Se não plantassem e se não tirarmos o lixo, a gente pescador vai sofrer e não vamos ter mais a maré e assim não podemos sobreviver, o projeto semear e colher está mudando essa situação”, Afirmou Novo, Pescador da Ilha de Deus.
“O projeto Semear e Colher foi e é importante para nossa Ilha, pois através dele, trouxemos mais jovens e a comunidade ficou mais reconhecida”, concluiu Nalvinha da Ilha, Presidente do Saber Viver.
Foi assim, com tantas histórias e transformação de vida, fazendo com que várias comunidades do nosso Nordeste voltassem a sorrir que o projeto Semear e Colher demonstrou o impacto que a aproximação do consumidor de alimentos com a atividade da produção pode ter para o desenvolvimento sustentável de comunidades, considerando os indivíduos e o espaço que habitam de forma integral.
“Posso afirmar que desse projeto levamos: o aprendizado com as plantas, o cuidado, o amor, onde levamos para uma vida melhor e aprendemos a trabalhar a humildade”, disse Sygridy Roberto da Comunidade Pequenos Profetas do Recife.